Estaria a burguesia brasileira passando por uma crise do sufrágio que se apresentaria no grande número de abstenções (votos brancos/nulos) no último processo eleitoral, em especial, nas cidades que houve segundo turno, a exemplo no Rio de Janeiro onde a soma de votos brancos e nulos venceu o candidato eleito?
O sufrágio universal foi uma saída encontrada pela burguesia liberal contra a grande burguesia monárquica nas primeiras revoluções nos países onde o feudalismo perdia espaço para o capitalismo que surgia na Europa.
Desde as primeiras revoluções da Europa onde os derrotados e os ganhadores (frações da burguesia) para dar um ar de “novos tempos” instituíram o sufrágio universal – em muitos casos restritos a camadas da sociedade dos mais abastados, chamado “voto censitário” – com o discurso de estarem garantindo o aumento das liberdades democráticas nas novas estruturas de poder que se formava. Na revolução francesa de 1789 o sufrágio universal – “um homem, um voto” – dava uma importante vantagem para a burguesia e burocratas da época.
Nos modelos democráticos atuais as ditas liberdades democráticas e políticas, a exemplo do século XVIII nunca deixou de ter um víeis de “voto censitário”, passando dos que podiam votar, para os a quem efetivamente teria condições de ser escolhido para receber o voto. Ou seja, na democracia do voto brasileiro todos podem se candidatar e receber os votos, mas só aqueles com poder aquisitivo, tempo de TV e proximidade com as estruturas de poder dominante recebem o voto. Os demais se limitam a ficar dando legitimidade da democracia burguesa para os que se manterão no poder.
Nesse ano de 2016, essa lógica de acreditar nas mudanças através do voto teve uma grande demonstração de fraqueza, principalmente para os partidos e candidatos das elites que se confiam nesse instrumento para continuarem no poder, tudo isso com o respaldo de uma maioria que não vê a mudança de sua realidade alterada passadas várias eleições.
A representatividade dos eleitos, sem a maioria dos votos, aponta para um recado aos eleitos que eles não representam a maioria, ou seja, seu discurso de que foi eleito pela vontade do povo – no sentido de ser um corpo consolidado – será preciso ser refeito. Vários candidatos eleitos terão que dizer que se encontram nessas condições graças aos que – por razões pouco democráticas – decidiram escolher entre o ruim e o pior.
Há uma grande preocupação que ronda a proposta de democracia representativa da burguesia, que é a certeza que os eleitores passam a não acreditam nos processos eleitorais como alternativas de melhoria de suas condições de vida. E, as razões para isso são muitas: a grande maioria dos eleitos não é da mesma classe dos que votam para elegê-los; os interesses do povo que vota (mais saúde, educação, infraestrutura etc.) são substituídos pelos interesses de bancos e grandes empresas (pagamento de dívidas, obras superfaturadas etc.); os discursos nas campanhas de defenderem os trabalhadores, aposentados e jovens ao passo que se elegem passam a legislar ou executar (no caso de prefeito, governador e presidente) justamente contra os direitos conquistados por essa fatia da sociedade.
Muitos são os discursos de que para resolver a crise econômica e política que ficou exposta em 2016 seria equacionada em 2018 com as eleições para a presidência. Os movimentos que se acirram com paralisações, manifestações, ocupações e greves demonstram que não será bem assim. Se não acreditaram numa mudança via eleição municipal, onde os poderes são mais próximos de sua realidade, acreditarão numa mudança que surgiria a partir do centro do poder, onde o esgoto da corrupção jorra como o esgoto da frente de sua casa, com um mau cheiro insuportável?
Não será 2018 que nos dará respostas, será o percurso daqui até lá.